A Maçonaria Antiga na Inglaterra
A Confederação da Maçonaria Simbólica do Brasil- C.M.S.B., ao comemorar os sessenta e oito anos de criação das Grandes Lojas Brasileiras pelo inolvidável Mário Behring, busca implementar parte das ações preconizadas em seu estatuto, através do lançamento da edição periódica de informações denominada Série Jônica, com vistas a intensificar a difusão da doutrina, postulário e ideário da Maçonaria Universal junto às Confederadas e Lojas Jurisdicionadas. Esta iniciativa vem cobrir uma lacuna há muito reclamada pela família maçônica brasileira, no tocante ao enriquecimento dos conhecimentos da Ordem em geral.
José Abelardo Lunardelli
O ano de 1717 viu a formação da Grande Loja da Inglaterra, a Grande Loja Mãe do Mundo. A história da Franco-maçonaria após esta data é bem conhecida. Mas, o que dizer da Maçonaria na Inglaterra antes desta data? Este resumo foi extraído do artigo publicado pelo Irm:. C. N. Batham sob o título de A Grande Loja da Inglaterra (1717) e suas Lojas fundadoras. O artigo foi publicado no vol. 103, página 22, da Ars Quatuor Coronatorum (Transactions of Quatuor Coronati Lodge n.2076).
Introdução – A Franco-maçonaria no Século XVII
O famoso historiador maçônico R.F.Gould escreveu uma vez: “…Mas nossas Velhas Lojas na verdade tem sido muito negligenciadas e esquecidas por permanente culpa da Arte inglesa… Nossas primeiras Lojas aguardam ainda uma adequada e permanente crônica de seus esforços como pioneiras do progresso maçônico…”
Este artigo não pretende, por nenhum esforço de imaginação, apresentar esta crônica, mas sim apenas reunir material sobre aqueles pioneiros, selecionados de registros maçônicos, alguns dos quais não são de fácil acesso.
Talvez eles possam dar aos Irmãos de hoje uma compreensão do débito que temos para com aqueles antigos Irmãos e, ao mesmo, tempo capacitá-los a explorar alguns atalhos não familiares.
Para isto, entretanto, é necessário primeiro considerar a situação maçônica no Séc. XVII. É uma grande surpresa para muitos Irmãos saber que não existem registros maçônicos oficiais de qualquer tipo anteriores à primeira edição das Constituições de Anderson, publicadas em 1723.
Certamente existem referências à Franco-maçonaria e a Cerimônias de Iniciação no Séc. XVII, mas são todas de natureza secundária. A primeira é por Elias Ashmole, que escreveu em seu diário que ele e o coronel Henry Mainwaring foram feitos Franco-maçons em Warington, Lancashire, em 16 de outubro de 1646. Desconhece-se onde e quando os sete Irmãos presentes naquela ocasião tinham sido previamente iniciados. Uma cópia das Old Charges (Sloane MS N.3848) foi feita por Edward Sankey e terminada na mesma data. Parece certo que ele era filho de um dos Irmãos presentes no encontro.
Estes dois fatos indicam que a cópia foi feita para uso na Cerimônia, visto que naquela época considerava-se a posse de uma cópia das Old Charges como essencial para um encontro maçônico no qual um candidato estava para tornar-se Maçom. Isto também favorece a sugestão de que não tínhamos ali uma Loja permanente, mas sim uma reunião privada de alguns amigos que eram Maçons, que se reuniam com o único propósito de admitir dois de seus amigos na Arte Real.
A única outra referência à Franco-maçonaria no diário de Ashmole é de 10 de março de 1682, quando ele registra que foi convocado para comparecer a uma Loja em Masons’ Hall, em Londres, no dia seguinte, quando seis pessoas foram admitidas na Fraternidade dos Franco-maçons. Ainda que não exista menção de Maçonaria no diário durante os 36 anos intermediários, Ashmole certamente deve ter mantido algum contato com a Arte, pois, de outra maneira, seria inconcebível que ele fosse convocado para uma reunião após aquele considerável lapso de tempo e para uma Loja tão distante do local de sua Iniciação. Parece provável que esta Loja em Masons’ Hall tenha sido de natureza mais permanente, ainda que se reunisse só em caso de necessidade, pois tudo indica que havia uma Loja na Companhia de Maçons de Londres – e existem referências aparentes a Iniciações em intervalos regulares de 1621 em diante.
Não existe, entretanto, qualquer registro oficial desta Loja nem qualquer outra referência que consubstancie a afirmação, às vezes feita, de que aquela foi a origem da atual Lodge of Antíquíty n° 2 (Loja da Antigüidade). Randle Holme, Mestre de Armas, foi Maçom, possivelmente Iniciado numa Loja em Chester, por volta de 1665. Alguns anos mais tarde, ele escreveu uma lista com 27 membros da Loja, incluindo a si mesmo. Em 1732, o Irmão Edward Hall, um membro da Loja que se reunia no Swan (cisne), em East Street, Chichester, registrou que havia sido feito Maçom, em uma Loja em Chichester, pelo falecido Duque de Richmond, trinta e cinco anos antes, ou seja, em 1696.
Em 1705 / 6, Sir George Tempest presidiu uma Loja em York que era provavelmente datada de 1693, senão antes. Existem referências subseqüentes a esta Loja até ela tornar-se a Grande Loja de Toda Inglaterra em York, em 1725.
Em 1704, Jonathan Belcher, o primeiro nativo nascido na América a ser admitido na Ordem – e que mais tarde tornar-se-ia Governador de New Jersey – foi Iniciado em Londres no que ele descreve como Uma Velha Loja de Guilda, obviamente datada do século anterior.
Isto é tudo o que existe. Estes seis registros secundários são esparsos, mas precisamos ter em mente que, na edição de 1738 das Constituições, Anderson declara que Sir Robert Clayton compareceu a uma Loja ocasional de seus Irmãos Mestres para alertar aos dirigentes sobre a melhor maneira de reconstruir aquele Hospital (S. Thomas) …” E ele então se refere a sete ou mais Lojas, das quais não existe qualquer outra menção. Porém, em vista de sua falta de confiabilidade, associada ao fato dele em seguida dizer que o rei William III foi anteriormente feíto Maçom, é questionável se qualquer certeza pode ser atribuída às suas declarações.
Não obstante, deve ter havido considerável atividade maçônica no Séc. XVII e início do Séc. XVIII que não foi registrada, mas que criava suspeita e interesse públicos em larga escala. Se não fosse pelo interesse público, não haveria nenhum propósito em incluir uma referência à Maçonaria no indecente pasquim Poor Robin’s Intelligence (A inteligência do pobre Robin), de 1676 – 7. Nem teria um autor desconhecido achado necessário publicar um panfleto Alertando todas as pessoas, piedosas da cidade de Londres para as maldades praticadas aos olhos de Deus pelos chamados Franco-maçons. Ele continuava: “…Eu digo que tomem cuidado para que as suas cerimônias e juramentos secretos não se apossem de vocês; e estejam alertas que ninguém os desviem dos caminhos de Deus.”
Em 1 709 e 1710, Richard Steele publicou ensaios no The Tatter (O Fofoqueiro), no qual referia-se à Maçonaria, e no ano anterior, um panfleto impresso em Londres mencionava”… uma certa Companhia chamada Franco-Maçonaria…” Finalmente, Robert Plot, em sua História Natural de Staffordshire (1686), refere-se à Maçonaria como estando “… mais ou menos espalhada pela nação”. John Aubrey também se refere à Ordem, ainda que suas declarações sejam suspeitas, na sua História Natural de Miltshire (também em 1686).
As Constituições de Anderson dos Franco-maçons (1723)
É sobrepondo-se aos aspectos mencionados neste esboço que a primeira referência oficial à Ordem aparece em 1723. Foi a primeira edição das Constituições de Anderson e foi publicada sob a autoridade da recém-fundada primeira Grande Loja da Inglaterra, a Loja Mãe do mundo. Foi publicada “…Por ordem de Sua Graça, o Duque de Warton, o atual Honorável Venerável Grão-Mestre dos Maçons Livres”, que mais tarde seria indicado como primeiro Grão-Mestre da Grande Loja da França, a única pessoa a ocupar aquela função em duas potências diferentes. A apresentação foi assinada pelo Deputado de Grão-Mestre, Df. J. T. Desagulier, que tinha sido Grão-Mestre em 1719-20, o único francês a alcançar aquela alta posição.
A publicação de Anderson consistia de uma chamada História da Maçonaria, altamente imaginativa, abrangendo da época de Adão até 1721; (a) de uma lista de obrigações a ser lida na Iniciação de novos Irmãos; (b) dos Regulamentos da Ordem; (c) da maneira de se constituir uma nova Loja; (d) de uma lista dos Mestres (Veneráveis) e Vigilantes de vinte Lojas e (e) de uma coleção de canções, incluindo a Canção de Entrada dos Aprendizes, ainda hoje cantada em eventos sociais maçônicos. Ele refere-se à Maçonaria como tendo sido revitalizada “…sob nosso atual GrãoMestre, o muito Nobre Príncipe John, Duque de Montague”. Mas não dá qualquer informação sobre a fundação da Grande Loja da Inglaterra.
O panorama então era de Lojas espalhadas pelo país, reunindo-se irregularmente, de acordo com as necessidades da ocasião, talvez sem sobreviver por períodos maiores de tempo, e de encontros informais de grupos de membros da Ordem, com o único propósito de iniciar seus amigos.
Não existe nada além de referências resumidas às suas Cerimônias. Infelizmente, para os historiadores maçônicos, juravam guardar o mais profundo segredo sobre todos as aspectos da Maçonaria, comprometendo-se a nada escrever, se pudessem evitar fazê-lo. Quando precisavam escrever, eles destruíam tais escritos logo que tivessem servido aos seus propósitos.
George Payne (Grão-Mestre em 1718-19 e 1720-21) reclamava que vários manuscritos valiosos “…foram muito apressadamente queimados por alguns Irmãos escrupulosos, para que não caíssem em mãos estranhas.” Aquelas Lojas só tinham conhecimento de outras Lojas em sua imediata proximidade e eram inteiramente independentes e autogovernadas, pois não havia uma autoridade central para exercer controle sobre elas.
Os meios de comunicação não haviam melhorado substancialmente desde a época do Império Romano e, especialmente porque não se mantinham registros escritos e todas as instruções eram orais, devem ter existido variações consideráveis nos detalhes do cerimonial observado nessas Lojas.
Apenas dois graus eram trabalhados, ambos freqüentemente na mesma reunião, até que algumas Lojas, mas não todas, começaram a praticar o terceiro grau na década de 1720.
(Francisco Pucci)