Judas, ao cumprir sua dolorosa e árdua tarefa, indica a senha que dará à malta que vai prender seu mestre que, qual cordeiro, se destina ao holocausto. Escolhe o sinal usual de respeito entre discípulos e mestres: o beijo na face. Ao chegar próximo de Jesus, embora firme em sua resolução de colaborar no drama sagrado, está constrangido e de coração amargurado, ao proferir as palavras de praxe: “Salve, Mestre!” Seu olhar e sua vibração deviam ser de profunda tristeza e apreensão, que se manifestaram no tom em que proferiu as palavras. De tal forma devia estar abatido, que Jesus sentiu piedade e fez questão de confortá-lo com a resposta tranquilizadora registrada por Mateus, que assistiu pessoalmente à cena: “Amigo, vieste para isso?”
Lembrava-lhe, assim, a resolução de seu Espírito, anterior à reencarnação, fazendo-lhe ver que tomara corpo físico na Terra, exatamente com essa finalidade: como sacerdote da Escola Iniciática “Assembleia do Caminho”, entregar a vítima às mãos do Colégio Sacerdotal do Sinédrio, para que se consumasse o holocausto e fosse galgado mais um degrau na escala evolutiva de Jesus. A frase de Jesus a Judas foi realmente tranquilizante “vieste para isso”.
O vocativo amigo, com a palavra hetaíre – que exprime a amizade de companheirismo e camaradagem absolutas – revela que o ato de Judas não foi de forma alguma considerado por Jesus como uma ‘traição’, e sim como um testemunho de amizade, pois Judas estava ajudando a cumprir Sua missão dolorosa: era muito melhor que tudo ocorresse como estava previsto, do que ser deixado à discrição popular, arriscando-se o drama a não atingir sua finalidade predeterminada.
Só os verdadeiros ‘amigos’ são capazes de atos que, mesmo beneficiando, serão julgados por todos os que a eles assistem, mesquinhos e maléficos: ao amigo não importa a opinião das massas, mas sim o resultado bom que o amigo vai experimentar. E por isso são os ‘verdadeiros amigos’ que avisam e repreendem de cara, ao invés de falar pelas costas. Só os ‘verdadeiros amigos’ são capazes de prejudicar-se até o âmago, para proporcionar ao amigo uma posição superior e vantajosa.
(Sabedoria do Evangelho – Capítulo Prisão Movimentada -Volume 8 – Carlos Torres Pastorino).